segunda-feira, 4 de novembro de 2013

As cores da moda, ou as modas para as cores

A geração anterior à minha chamava-lhe grenat, a minha simplificou-lhe o nome, nacionalizou-o, e passou a chamar-lhe cor de vinho. Depois, nem sei bem quando, talvez já nos anos 90, mudámos-lhe a designação para bordeaux. Talvez estivéssemos a armar-nos aos cucos, a armar em finas, como se tivéssemos tido uma Mademoiselle em casa na infância, não sei bem. O que sei é que o nome se aguentou por muitos e bons anos, tantos que foi preciso chegar a esta nova estação para que as "féxionistas" (obrigada, Izzie!) descobrissem o burgundy, que parece ser agora a cor.

Devo dizer que, não ligasse eu tão pouco à moda, ficaria muito feliz pelo protagonismo repescado desta cor de Inverno. Tenho no armário uns sapatos Dior e uma capa da Marias que é um assombro, coisas com mais de vinte anos. Será fácil fotografar os sapatos, outro tanto não acontece com a capa, e é uma pena.

O que vejo acima de qualquer outra coisa nestas mudanças de nomes para as mesmas tonalidades é a morte declarada da cultura francesa, o reinado emergente das culturas de expressão inglesa, a moda terá sido provavelmente o último baluarte que conquistaram, e tenho para mim que por uma razão muito simples: os anglo-saxónicos têm uma incapacidade trágica para pronúncias alheias. E os termos relacionados com a moda, com o vestir, foram durante décadas termos franceses. Não dou nem dez anos, terão desaparecido todos. E assim o bordeaux passou neste Outono a chamar-se burgundy. E aqui entra a tonteira manifestamente saloia de quase tudo o que tem pretensões a ser blogue de moda nacional: para almejar uma voz em qualquer área, mesmo uma área tão volátil como a da moda, conviria ter alguns conhecimentos. Retomemos as cores, voltemos ao bordeaux e ao burgundy. Sabereis vós, queridas tontas dos blogues de moda, que de português pouco sabem, nem falemos de línguas estrangeiras, os significados das parvoeiras, ora deprimentes ora irresistivelmente cómicas, que escrevem? Considerem isto serviço público, são giras e levezinhas, são tão ignorantes que até dói. Bordeaux? É um vinho, são os vinhos da região de Bordéus (França, vão ao mapa, se quiserem aprofundar, duvido muito que queiram, daquilo que as meninas gostam mesmo é de trapos em materiais menores e mal acabados, quanto mais baratos melhor). Burgundy? É outro vinho, a designação no mundo da moda é bem representativa da tal ascensão do inglês. Burgundy quer dizer Bourgogne, Borgonha em português, outra região de vinhos. E assim voltamos ao tema inicial, à cor primeira. Que é de vinho.

E, por falar nisso, aproveito para vos mostrar a manta em rosetas de crochet que é a obra que tenho neste momento em mãos, despachada que está outra em tons de azul que os meus dedos ágeis e angustiados devoraram em menos de três semanas. É que, meus bons amigos, vou em 24 dias sem fumar. Esta manta, em tons de grenat, vinho, bordeaux, burgundy, o que quiserem, destina-se a uma amiga muito querida. E estas foram as cores que ela pediu. Sem mariquices pretensiosas. She's my girl.

11 comentários:

  1. bolas! já tinha saudades do registo ímpar dos seus posts: culto, confidente e ferino.

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  2. Gosto tanto de a ler. Há, em relação à moda e em andar na moda, quem julgue que descobriu a pólvora.

    Sim, sou do tempo da cor de vinho.

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  3. José,
    E eu adoro a sua adjectivação, mesmo que seja imerecida, como é o meu caso. Mas acho que já lhe disse isto.
    Saiba o meu bom amigo que há mais de um mês comecei a escrever um post que lhe era dedicado, e a coisa já ia bem extensa (meu incorrigível vício). Eis senão quando, por uma distracção minha, me apagou tudinho, e nada houve que eu pudesse fazer para recuperar. Conhece certamente o sentimento de frustração que nos acomete em situações destas, escrever novamente com as mesmas palavras e ficamos ainda mais exasperados quando temos a suspeita de que o que tínhamos escrito até nos tinha saído benzinho. Mas fica-lhe solenemente prometido que muito brevemente lançarei os dedos ao teclado para repor as palavras em falta.

    Helena,
    É que é isso mesmo, sem tirar nem pôr. E agora, só para si, conto uma história pateta aí dos meus 17 ou 18 anos que o seu comentário me fez evocar. Estávamos, o meu melhor amigo e eu, no quarto dele a ouvir música. Uma colectânea dos Bee Gees. Os moçoilos começam a cantar World e, aos versos «Now, I found that the world is round» eu ripostei com um encolher de ombros: «Parabéns, descobriram a pólvora seca!»
    O meu amigo esteve a rir uma eternidade.

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  4. Cheguei aqui pela mão da Mac, sabendo que a recomendação era para levar a sério. E foi. Não fumo, mas, ainda assim, faço umas coisitas com as agulhas. Gosto muito. Descomprime-me. E gostei da manta bordeaux ou cor de vinho ou lá o que quiserem chamar-lhe. Mas do que eu gostei mesmo foram das suas considerações sobre os delírios da moda.
    Muito bom!
    beijo
    Nina

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  5. Passei por essas fases todas na minha vida, embora oscile mais entre bordeaux e cor-de-vinho mas recuso-me determinantemente a usar o burgundy (ainda que tenhamos tido óptimas relações com a Borgonha), da mesma forma que nunca usarei runner quando toda a vida usei chemin.

    (e que bom chegar aqui e ouvir a Felicity Lott em Mozart!)

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  6. Entretanto lembrei-me de mais uns quantos vocábulos - o creme, que foi substituído pelo bege (pelo menos lá em casa); e a velha bombazine que as "féxionistas" tanto gostam de chamar veludo côtelé, mais dia menos dia vai ser chamada de corduroy (vai uma aposta?)

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  7. Nina,
    Seja bem-vinda. Já espreitei algumas das suas criações, ao pé de si só uma amadora medíocre. :)
    Beijo.

    Pedro,
    Está a ver? Também com o chemin assistimos mais uma vez ao declínio do francês, que cada vez menos gente fala.
    Já quanto ao veludo côtelé, discordo de si. Desde miúda que o conheço assim, sendo que era o mais fino, de risca mais estreitinha, para mim bombazina sempre foi o de risca mais grossa. Mas não tenho qualquer dúvida de que o corduroy em breve dará um ar da sua graça. Nesse dia vamos rir bastante, hem?

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  8. Nina,
    Seja bem-vinda. Já espreitei algumas das suas criações, ao pé de si só uma amadora medíocre. :)
    Beijo.

    Pedro,
    Está a ver? Também com o chemin assistimos mais uma vez ao declínio do francês, que cada vez menos gente fala.
    Já quanto ao veludo côtelé, discordo de si. Desde miúda que o conheço assim, sendo que era o mais fino, de risca mais estreitinha, para mim bombazina sempre foi o de risca mais grossa. Mas não tenho qualquer dúvida de que o corduroy em breve dará um ar da sua graça. Nesse dia vamos rir bastante, hem?

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  9. "Fexionistas" nunca poderia ter um acento no "e". :)

    Beijinho, Teresa.

    Filipa

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  10. Claro que não, Filipa. Mas trata-se de uma palavra inventada, a meu ver o acento ainda a torna mais ridícula. :)
    Beijinho.

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